Por Nikki
Revisão: Calisto M. F., Eloah Nobre e Ravi Pires
Estou aqui para falar de um tema que é pouco discutido na comunidade aroace e que deveria receber mais atenção: a experiência de ser ace, aro ou aroace e ser não-branque. Nesse texto vou falar sobre a minha experiência como uma pessoa negra e ace.
Aces não-branques podem falar sobre as suas experiências nos comentários.
Eu me chamo Nikki, sou uma pessoa negra de 16 anos (no caso, não-binária) e demissexual. Assim como toda pessoa assexual, eu tive a minha fase de descoberta, que foi complicada por diversos motivos, um dos quais foi justamente a questão da hipersexualização que é um problema que atinge a vida de muitas pessoas pretas.
A sociedade racista nos impõe que devemos ser atraentes sob a ótica branca, que exige que tenhamos um tipo de corpo, um tipo de atitude que nos objetifica, e isso acarreta diversos problemas emocionais e físicos e atrapalha o momento de descoberta quando se trata de uma pessoa aroace.
Eu me descobri demi aos 14 anos. Antes disso, eu já havia notado que era diferente das outras pessoas, pois no meu círculo social elas se relacionavam conforme a norma: tendo relacionamentos heterossexuais, com pessoas cis e sendo alos.
Aliás, nessa época, as minhas colegas de classe já falavam de namoro e sexo e eu me sentia deslocada porque as discussões eram sempre sobre com quem elas ficariam, como elas queriam beijar, transar, ainda mais quando viam tal pessoa que sentiam atração sexual e se despertavam logo de cara, se é que vocês me entendem.
Eu não era assim. Eu mal sentia atração sexual e quando sentia era com uma pessoa por quem eu estava atraída romanticamente, então eu estranhava muito quando as minhas colegas surtavam com algum cara que estivesse sem camisa ou até mesmo quando viam uma pessoa atraente e falavam que sentiam vontade de transar com ela.
Não só estranhava, como ainda me questionava do porquê de elas agirem assim.
Eu sentia essas coisas, porém eu não sabia se aquilo tinha nome até descobrir a assexualidade em um artigo na internet e, só então, passei a me sentir um pouco mais confortável. Porém, aquilo não foi o fim da minha descoberta e sim o início, já que foi depois disso que comecei a questionar a minha sexualidade.
Esse processo foi difícil, principalmente porque eu tinha a ideia de que eu não poderia ser ace por diversos motivos, um dos maiores sendo a sexualização que sofria. Na época, eu nem sabia o que era isso e que era consequência do racismo, mas sofria as consequências dessa hipersexualização e isso me adoecia demais.
Tinha sido tão sexualizada que eu pensava que eu era indigna de tudo, até mesmo de ter uma sexualidade e claro: de ser ace, afinal se eu era vista apenas como um ser que só servia para dar prazer para outres, como que vou ser uma coisa totalmente oposta, não é mesmo?
A notícia boa é que esse processo de descoberta terminou quando finalmente entendi que não era menos válide como ace por sentir atração sexual e por gostar de sexo, e que não era obrigada a corresponder a certos estereótipos.
Contudo, a minha vivência não deixou de ser complicada por causa disso. Até hoje continua sendo difícil ser negre e ace, especialmente por ser considerado um ser invisível dentro da comunidade ace.
Olá, Nikki! Meu nome é Rapha, tenho 26 anos e sou uma mulher negra cis, demisexual. Gostei do seu texto e concordo plenamente que a interseccionalidade de raça nas questões assexuais não é amplamente discutida, mas deveria. Minha experiência e descoberta vem de um longo caminho, com diversas fases, desde a adolescência (quando questionava sobre hipersexualização e racismo) até minha fase adulta, em que percebo o impacto disso no tema da Solidão da Mulher Negra. Fico feliz pela sua iniciativa de discutir sobre o assunto, parabéns!
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Obrigada
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